Texto
pesquisado:
Histórias de ser e de
se fazer educador: desvelando a identidade do professor universitário e suas
possibilidades emancipatórias
Maria Vilani
Cosme de Carvalho
VOCAÇÃO PEDAGÓGICA:
RESSIGNIFICANDO O
SENTIDO PROFISSIONAL DOCENTE
Por Moisés C. Bezerril
PRESSUPOSTO BÁSICO DA AUTORA
Tornamo-nos professores no processo
interativo do qual constituímos histórica e socialmente nosso modo de ser no
mundo, constatando que as nossas formas de compreender o mundo objetivo, nós
mesmo e os outros são constituídas conforme interagimos nesse mundo. Em outros
termos, é na dinâmica indivíduo e mundo que nos apropriamos dos significados já
elaborados pela humanidade, produzimos um sentido pessoal para eles e
construímos nossa capacidade de discernir e aprender o mundo – a nossa
consciência. (VYGOTSKY)
O PERFIL DO PROFESSOR DE ENSINO SUPERIOR NA UFPI
O texto da professora Maria Vilani é uma reflexão sobre a
identidade do professor universitário, produzida a partir da constatação de um
novo contexto histórico social em profundas mudanças, e que este novo contexto
está trazendo transformações na pessoa e no fazer do professor. A autora
entende que os professores universitários foram adequando-se a mudanças e
redirecionando os modos de entender e desenvolver as atividades de docentes de
acordo com o que o Ministério da Educação foi propondo e executando. Ela
considera que a busca por pós graduações stricto
senso e atividades alheias à UFPI
indicam mudanças nessa categoria de profissionais, que podem estar
ressignificando seus modos de ser e de se fazer educador.
As perguntas
mais inquietadoras levantadas pela autora são: quem são os professores que
estão nas IES vivenciando esse contexto? Que sentido atribuem à carreira
docente? Que sentimentos desenvolveram em relação à profissão? Será que os
novos caminhos que estão percorrendo podem ser consideradas possibilidades
emancipadoras? O estudo, portanto, da autora consiste de uma investigação e
análise dessas perguntas. Tal estudo é uma tentativa de se compreender a
construção da identidade do professor universitário e o sentido que atribuem à
carreira docente. Para isto, ela amplia suas reflexões teóricas sobre o
processo social de tornar-se humano, bem como desenvolve uma pesquisa
empírica sobre o processo de tornar-se professor
universitário.
Em seu
procedimento metodológico, a autora escolheu professores do departamento de
pedagogia da UFPI para uma observação em sua singularidade de professores universitários,
conduzindo a investigação sem quantificar, considerando que sua amostragem é
suficiente para representar uma generalidade da categoria. Na primeira etapa da
pesquisa a autora fez levantamento de dados por meio de questionários sobre
condições sociais, formação acadêmica e trajetória profissional, com perguntas
fechadas e abertas. Essas perguntas visaram delinear um perfil do professor,
bem como saber sobre sua visão dos motivos para a escolha e permanência na
carreira e como se sentiam como professores universitários no Brasil. Na
segunda etapa a autora empregou uma entrevista com uma técnica de história de
vida para compreender a lógica do processo de construção da identidade do
professor universitário. Depois dos dados coletados, fez-se uma interpretação
com base em reflexões e articulações com a teoria e a realidade.
OS DADOS DA PESQUISA REVELARAM O SEGUINTE PERFIL DO PROFESSOR
UNIVERSITÁRIO DE PEDAGOGIA DA UFPI:
1) Jovens piauienses oriundos de classes baixa e médio-baixa.
2) Quase todos os professores estudaram em instituições
públicas de ensino superior (UFPI);
3) Mesmo que eles hoje tenham boa condição de subsistência,
eles não têm condições de investir na carreira profissional;
4) Concluíram seus cursos superiores entre 1970 e 1990 e já ingressaram na carreira profissional
enquanto faziam pós graduação nessas condições e condições socioeconômicas adversas e desvalorizadoras
no país.
5) Mesmo sem condições para tal, esses professores
reconheceram-se como professores e ingressaram em programas de especialização
de mestrado e doutorado por todo o Brasil entre 1977 e 2001.
Os dados
revelam que os professores universitários atuais estão procurando
especialização e capacitação de mestre muito mais cedo do que a uma década
atrás, quando eles ingressavam no magistério apenas com a graduação. Mesmo
levando em conta tal progresso nessa categoria, é fato que as políticas do MEC
não viabilizam o progresso de universidades pequenas como a UFPI. Segundo
informação da autora, o surgimento de muitos mestres e doutores viabiliza o
funcionamento das universidades, mas o governo não investe para essas
instituições funcionarem em sua extensão máxima. Por conta disso, mesmo
doutores, eles não conseguem ser ou fazer-se professores em todas as suas
dimensões.
Considerando
esses perfis e o estado de sua carreira atual, a autora nos leva refletir sobre
como esses profissionais vivem o dilema de terem buscado alto aprimoramento em
sua profissão e agora não têm condições de realização. Ela especula que esses
professores teriam chances de serem professores de pós graduação, pesquisador,
ou divulgador de conhecimentos, mas com a política atual do MEC, talvez
continuem sendo apenas professores de graduação. Ressalta-se o fato de que hoje
85% dos professores são acadêmicos de tempo integral que se comprometem com a
UFPI de maneira integral e incondicional. No entanto é cada vez mais comum tais
professores de tempo integral buscarem atividades extra UFPI para
complementação de suas rendas.
Outro fator digno de nota é constatar que
apenas 41% dos professores realizam
pesquisas e 26% realizam atividade de extensão; a publicação de obras e
apresentação de trabalhos em congressos abrange apenas 74%, mas não atingem setores
mais amplos da sociedade. Por que isso acontece? Primeiro porque o contexto político-institucional
exige produção científica mas não viabiliza o processo. Ainda assim é crescente
o número de mestres e doutores produzindo pesquisas e divulgando conhecimentos.
A interpretação que a autora faz desse paradoxo é que os professores
universitários da UFPI apresentam condições para serem pesquisadores,
divulgadores e outros, mas o contexto político-institucional com suas medidas
legais tem impedido e inviabilizado os docentes de se desenvolverem como
pesquisadores. Isso seria a principal causa por que os docentes têm se
distanciado da academia. À luz dos teóricos, pode-se dizer que embora os
professores da UFPI tenham vivido e ainda vivem um contexto adverso ao
exercício da docência, ainda assim eles buscam caminhos que podem ou não tornar
viável o ser e fazer-se professor universitário em toda a sua amplitude.
RESSIGNIFICAÇÃO DA
VOCAÇÃO PEDAGÓGICA
As concepções que temos
sobre o que é ser professor universitário hoje foram produzidas no processo
histórico-social de se fazer professor e envolvem os saberes, conceitos,
preconceitos, valores, crenças, motivações, expectativas, habilidades,
atitudes, dentre outros, que nos apropriamos no decorrer da nossa vida,
sobretudo da vida de professor.
FATORES QUE INFLUENCIARAM NA ESCOLHA PROFISSIONAL:
FATORES DE ORDEM PESSOAL
Durante a
pesquisa a autora investiga os fatores que influenciaram na escolha
profissional do grupo investigado. Ela constata que tais fatores envolveram
interesses, gostos, prazer nas interações humanas com os outros, a oportunidade
de vivenciar situações ou atividades ligadas ao magistério, as condições
objetivas de vida, o significado que a profissão tem na sociedade e na vida do
professor. No entanto, embora as ações humanas tenham um motivo específico
determinando-as, é difícil detectar qual exatamente aquele que está subjacente
a um tipo de comportamento, já que são muitas as determinações que constituem o
humano.
Uma parcela
significativa (38%0 enumerou mais de um motivo para justificar sua escolha pelo
magistério, revelando estarem confusos quanto ao que os levou a essa profissão.
Dentre
esses fatores que explicam o porquê da opção dos pesquisados pela docência, boa
parte desses profissionais (62%) relatou ter escolhido por se identificar, por
ter interesse, motivação, gosto pela profissão. Isso significa que os elementos
do mundo subjetivo são construídos na história de suas vidas e não por aptidão,
dom ou vocação natural.
FATORES DE ORDEM SOCIAL
Os fatores
sociais, econômicos e culturais constituem o outro conjunto dos motivos
enumerados por grande parte dos professores (76%), os limites e as
possibilidades que lhes surgiram ao longo de seu contexto histórico-social. No
jogo da escolha profissional nossos gostos, desejos, interesses são suplantados
pelos fatores de ordem social, econômica e cultural.
Entretanto
parte dos professores (38%) justificou sua escolha pelo magistério tanto por
motivos de ordem individual como por motivos sociais, econômicos e culturais
parecendo ser possível conciliar aquilo que as condições de vida permitem com
os interesses e expectativas. A escolha profissional este grupo foi uma
construção social porem articulada no plano individual.
Uma boa
parte desses profissionais (62%) explica a escolha profissional revelando
aspectos de sua história pessoal. Isso significa que os elementos do mundo
subjetivo não são intrínsecos ao indivíduo, mas ao contrário, são construídos
na história de suas vidas, e não por aptidão, dom ou vocação natural.
Em especial,
as condições concretas de nossa vida impõe os limites e as possibilidades que
acabam determinando nossa escolhas e, logo, nossos modos de ser e de nos fazer
no mundo.
Grande parte
dos professores (76%) enumerou os fatores sociais, econômicos, e culturais como
o conjunto de motivos pelos quais escolheram a docência.
A verdade é
que, no jogo da escolha profissional, nós somos orientados por uma
multiplicidade de fatores, mas os de ordem social, econômica e cultural
contribuem para definir esse jogo e, em muitos casos, suplantam nossos desejos,
gostos, interesses e acabam nos direcionando para uma determinada profissão.
A escolha
profissional desse grupo, de fato, foi uma construção social, porém articulada
no plano individual, pois é resultante de uma síntese dos fatores envolvidos de
pesos diferentes na escolha da profissão.
Entendendo
que as escolhas podem ser repensadas, a autora pesquisou o porquê da permanecia
na profissão docente. A análise revelou que quase todos os professores (94%)
justificaram sua permanecia na profissão
com fatores predominantemente internos por terem repensado suas histórias de
vida e construído novos modos de ser e de se fazer professor, sendo muito mais
influenciados por seus gostos , aptidões e crenças e a experiência acumulada do
que na época de suas escolhas.
Desse modo,
ficou caro que a escolha profissional dos professores, bem como o que motivou e
está motivando esse grupo a permanecer nessa profissão são os vários fatores do
seu mundo subjetivo e objetivo, que, articulados entre si, determinam e
ressignificam seus modos de ser e de estar no mundo.
Se quase
metade dos professores manifestou fatores internos e externos para explicar sua
permanência na profissão, a autora deduz que esse grupo mostrou formas de
compreender a atividade docente articulando-as com o significado social da
profissão. Isso mereceu ser bem mais investigado.
Comentários
Postar um comentário